terça-feira, 4 de dezembro de 2007

Opinião: Vítor Fonseca


Crimes contra o Estado
Recentemente, um semanário, dos chamados de referência, a que Marcelo Rebelo de Sousa, numa conferência realizada há cerca de sete anos, em S. Vicente, na baixada santista, classificou de “jornal regional do eixo Lisboa-Cascais”, publicou uma notícia preocupante e que não mereceu, pelo menos até ao momento em que escrevo este artigo, das entidades públicas, qualquer comentário, explicação ou justificação.
A digitalização de documentos, eventualmente confidenciais e pertença do Estado Português, em concreto do Ministério da Defesa, feita por uma empresa privada, paga, eventualmente, por um partido político, com verbas da campanha eleitoral, segundo diz a notícia, reveste-se de uma gravidade intolerável num Estado de Direito democrático, mesmo que este Estado se situe entre primeiro e o terceiro-mundo.
Para além de Portugal pertencer à NATO, a Defesa Nacional continua a ser, num quadro de expansão do terrorismo e da conflitualidade militar em alguns territórios da Europa, uma área de enorme sensibilidade, a merecer reserva, porque contende com envolventes estratégicas, essenciais ao resguardo da independência do Estado Português e da sua afirmação como Nação.
O autor da proeza já veio desmentir que os documentos fossem confidenciais mas, porque estive a ver um filme de domingo à tarde, com o título “O grande mentiroso”, só acredito se o Ministério Público e a Policia Judiciária investigarem e comprovarem que os documentos não passavam de meras notas de um ministro que não deveria ter tempo para mais nada a não ser escrever, diariamente, vinte e quatro páginas de apontamentos.
O Governo Português está confrontado com uma situação para a qual deve ter capacidade e coragem de dar uma resposta, sob o perigo de o Estado de Direito ser definitivamente deitado ao lixo.
Nos termos do disposto no artigo 316.º do Código Penal, sob a epígrafe Violação de segredo de Estado, plasma-se que, “quem, pondo em perigo interesses do Estado Português relativos à independência nacional, à unidade e à integridade do Estado ou à sua segurança interna e externa, transmitir, tornar acessível a pessoa não autorizada, ou tornar público facto ou documento, plano ou objecto que devem, em nome daqueles interesses, manter-se secretos é punido com pena de prisão de dois a oito anos”.
E, “se o agente praticar facto descrito nos números anteriores violando dever especificamente imposto pelo estatuto da sua função ou serviço, ou da missão que lhe foi conferida por autoridade competente, é punido com pena de prisão de três a dez anos”.
A digitalização de documentos do Ministério da Defesa, caso se integrem na previsão do dispositivo da lei penal, constitui um crime público, que deve ser investigado pelo Ministério Público, independentemente de queixa.
George Orwell dizia que uns são mais iguais do que outros, mas nenhum político, qualquer que ele seja pode estar acima da Lei, muito menos numa questão que envolve a segurança do Estado. Porque a ser assim, só se pode concluir uma de duas coisas, ou a segurança do Estado é uma treta e os serviços secretos servem apenas para servir o poder político e como meio de pressão sobre aqueles que se opõem a quem detém o poder, ou os segredos que foram digitalizados, a ser verdade que o foram, são de tal monta, que o prevaricador sabe que está protegido pelo manto da cobardia e da ignomínia de um Estado dilacerado pela corrupção na essência da sua existência enquanto Estado.

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